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Desde que me casei, vejo as férias como uma oportunidade de conexão máxima com a minha nova família. Antes de termos as nossas duas filhas, meu marido e eu fazíamos questão de viajar a sós. Depois que a vida nos presenteou com nossas meninas, seguimos com o plano de estreitamento das relações, fazendo pelo menos uma viagem por ano, entre dezembro e janeiro, meses das férias escolares. Ultimamente, com elas maiores, temos tido a necessidade de fazer também estas viagens em julho, pois a velocidade de crescimento, principalmente da nossa primogênita, já em fase pré adolescente, nos faz carecer ainda mais de momentos íntimos, com muito espaço para trocas, conversas, carinhos e apoios.
Minha vida sempre foi marcada por anos letivos, já que sempre trabalhei em escola. Sinto que, ao longo dos meses letivos, e ainda com quatro agendas diferentes em curso lá em casa, acabamos tendo menos tempo para o convívio “solto”, sem a correria do dia a dia, sem o relógio limitar nosso desejo de permanecer juntos. O fim de semana acaba não dando conta de compensar a matemática desequilibrada de 5 dias corridos para 2 de descanso. E nem sempre os fins de semana são livres, sem compromisso com ninguém. Enxergo nas férias, de inverno e de verão, especialmente nestes momentos em que estamos viajando somente nós quatro, a oportunidade de conexão que percebo muitas vezes faltar quando estamos imersos à rotina, com horários engessados para tudo.
A escolha do destino, obviamente considerando primeiro o custo e nossas possibilidades financeiras no momento, precisa ser um exercício democrático dentro da nossa dinâmica de grupo. Não podemos, Gui e eu, escolher um lugar que só combine conosco. Precisamos antecipadamente imaginar as crianças nele e depois, já no nosso destino, planejar o dia considerando que elas podem cansar, que podem ter mais fome que nós, que podem não gostar de um ou outro passeio que planejamos e que isso tudo também faz parte da vida. Algo importante também é lembrar que não podemos exigir que elas, com a idade que tem, tenham o mesmo interesse e a mesma maturidade que temos com mais de 40 anos.
Destinos que fazem o mesmo deserviço que a rotina já faz, separando cada um de nós, nunca foram nossa escolha. Nunca escolhemos resorts com tudo pago, com o pacote “crianças pra cá” e “adultos pra lá”, e dias e dias dispensados num único lugar, proximo ao bar e restaurantes do complexo, sem explorar o que a cidade oferece. Sempre buscamos destinos que envolvam a natureza, muitas possibilidades de exploração, cultura e, se possível, tranquilos e pouco populosos.
Nunca organizamos viagens para o consumo. Aquelas em que as pessoas se programam para renovar os guarda roupas ou fazer nascer uma estrutura para receber um bebê, comprando roupas, carrinho, bebê conforto, enfim, vários itens inclusive que a rotina depois mostrará que não terão muita serventia.
Outro tipo de viagem que não fazemos é aquela em que se programa conhecer vários países ou cidades em tempo recorde, com uma programação prévia muito bem pensada, para que não se perca um minuto do tempo em terras estrangeiras. Gostamos de mergulhar numa região, anotando antecipadamente os lugares que desejamos visitar, mas sem o engessamento de já colocar tudo isso numa agenda. Muitas vezes, é no vazio da programação não feita que vivemos os melhores momentos da viagem, que nos preenchemos, ainda que pareça estranho nos preencher no vazio.
Nestas viagens de família admiro com um pouco de distância a aproximação entre minhas duas filhas, começando com a necessidade de dormir no mesmo quarto, juntas, às vezes até na mesma cama… um grau de intimidade que considero alto. Dormir e acordar juntas, e passar o dia juntas, algumas vezes até organizando motins para reclamar de algum passeio que nós, Mãe e Pai, queremos fazer e elas não ou para negociar que não acordem tão cedo para a programação do outro dia, faz delas uma equipe dentro da equipe. Esta equipe paralela obviamente tem seus momentos altos de interação e outros mais baixos, com brigas e discussões, e ainda assim acredito ser incrível observar como elas verdadeiramente gostam da presença uma da outra. Fico feliz por elas terem este encontro de almas e minha cabeça vai longe, já imaginando-as na vida adulta e como se relacionarão. Meu coração de Mãe torce secretamente para que elas sigam podendo contar uma com a outra.
Outra equipe dentro da equipe somos eu e meu marido. Como trabalho na mesma escola em que as meninas estudam, dentro da nossa rotina, acabo tendo menos tempo de convívio com ele comparado ao tempo que tenho com as nossas filhas. Também enxergo estes momentos de férias a quatro como um presente e desfruto de todas as possibilidades de conexão com ele. É muito bom poder ir renovando este amor antigo nestes cenários atuais, escolhidos com tanto estudo prévio.
Nesta viagem que fizemos para o Norte da Argentina, à Salta (nos estabelendo na capital, que tem o mesmo nome) e Jujuy, dirigimos para três lugares diferentes: Cafayate (Salta), Purmamarca (Jujuy) e Salinas Grandes (Jujuy). Nos caminhos que percorremos, vimos paisagens fascinantes, montanhas enormes, de todas as cores e formatos, que fazem parte da Cordilheira dos Andes. Nos sentimos pequenos na imensidão daquelas rochas que começaram a se formar há 20 milhões de anos. O caminho passou a se tornar o ponto alto da viagem, e já não importava tanto o que veríamos ao chegar no destino final. Este poderia ser o lema das nossas vidas, inclusive. Valorizar mais os processos e não tanto o produto final. Valorizar e viver intensamente a trajetória e não focar tanto no lugar onde queremos chegar. Tornaria tudo muito mais orgânico, mais visceral, com menos ânsia e frustração.
Sabem aquelas pessoas que nunca se viram, mas que vivem situações coletivas de perigo e se sentem muito parte daquele grupo específico, estreitando laços inclusive para toda a vida? Entendo que, guardadas as devidas proporções, as viagens em familia também provocam um efeito semelhante. Cada viagem tem seus desafios, seus pequenos sustos, suas aventuras próprias e a sensação de termos enfrentado juntos estreita muito os laços entre nós.
Estou voltando para casa hoje na contagem regressiva para novamente abraçar um novo ano letivo, com suas quatro agendas distintas e todo o seu movimento natural de aproximação e distanciamento, físico e emocional. E a cada ano que passa tenho mais certeza de que na rotina do dia a dia tudo se dilui… Gosto mais das coisas concentradas. Me nutro mais quando a vida me apresenta o que tem de bom assim, em pacotes menores, concentrados, ainda que acabem mais rápido. A diluição eu deixo por conta do ano que está por vir.