Não perca nossas receitas! Inscreva-se!
Os sessenta mais certamente entenderão de forma perfeita o que escreverei: nada melhor do que ter convicção, maturidade e segurança para tomar decisões na vida, das pequenas às grandes. Mas este pacote que nomeio agora de “tríade mágica” imagino que só possamos abrir com muita terapia e anos vividos… acredito que pelo menos 4 décadas.
Estes dias estava estudando gráficos com a minha filhota menor, e imaginei como seria um gráfico da minha vida, com os grandes eventos destacados a cada década vivida. O marco zero, meu nascimento, obviamente. Primeira década, colocaria minha primeira festa de aniversário, que ganhei quando completei 10 anos e pude convidar todas as amigas e amigos da minha sala. Até então, eu só era a convidada, mas nunca tinha sido promovida a “convidadora”. Na segunda década, certamente o meu ingresso na UFPR, em Nutrição. Na terceira década, nascimento da minha primeira filhota e preparo afetivo e mental para receber a segunda. Na quarta década, a tranquilidade de estar com a vida bem estruturada: um companheiro parceiro, duas filhas amorosas, um trabalho que me permite mostrar quem realmente sou, meus valores, minhas ideias e que valoriza tudo isso, um lar gostoso para morar e a melhor fase de saúde física e mental que já experimentei, com o veganismo. A quinta década já está sendo vivida e, pelo que experimentei dela até agora, poderia palpitar que colocarei daqui a 6 anos e meio: liberdade, tranquilidade, maturidade, segurança e convicção para qualquer decisão que eu tenha que tomar.
Tenho vivido meus dias desta nova década com uma atenção natural e orgânica a tudo o que não me faz bem. Não gosto da sensação de “ter que fazer” algo. Quando este sentimento me visita, paro tudo e me faço perguntas: por quê mesmo que tenho que fazer? E, muitas vezes, concluo que não preciso e isso me traz um alívio imediato. Encontrar pessoas com quem eu não consiga ser eu mesma, por exemplo, é algo que não tenho mais feito nesta altura do meu gráfico. Viver situações em que eu não me sinta confortável, também ficou em outra década. Hoje já me conheço o suficiente para saber com convicção quais programas me agradam e quais companhias me fazem bem. E, ainda que tenham pessoas que me façam bem, sei também por quanto tempo de convívio eu usufruo deste benefício com elas. Algumas já sei que é por 2 ou 4 horas, por exemplo. Outras, eu nem conto as horas… elas passam despercebidas. Parece incoerente demais, e até desrespeitoso com meus anos vividos, eu ter que me submeter a situações e pessoas. A submissão esteve presente em várias décadas, mas consegui deixar ela para trás e está sendo libertador viver desta forma.
Hoje consigo me perdoar por tudo o que eu fui capaz de ser em outras décadas, entendendo que a minha falta de “força” e convicção de outrora me impulsionaram na formação de quem eu sou hoje. Seria um sofrimento duplo para mim se além do sofrimento que passei noutras décadas, eu ainda me punisse, nesta década atual, por não ter feito tudo de outra forma anteriormente. Hoje consegui mudar as lentes sobre mim e me enxergar com um certo tipo de orgulho e admiração, me aceitando exatamente como sou, imperfeita. Ao escrever isso lembrei de quando fiz a cirurgia a laser para corrigir a minha miopia de quase 5 graus. Entrei de óculos para o procedimento e saí enxergando tudo, nos mínimos detalhes, com nitidez, todos os contornos dos elementos animados e inanimados que compunham a minha vida, inclusive meu próprio rosto no espelho. Não foi fácil tomar a decisão de passar um laser nos olhos… procurei um especialista de confiança, tive que me organizar financeiramente, tive medo durante o procedimento e saí com um pouco de dor e uma lista de cuidados que deveria tomar. Mas, depois que tudo passou, eu até me arrependi de não ter feito a correção da miopia antes. Foi libertador me livrar dos óculos e das lentes de contato. Enxergar por mim mesma, sem me apoiar em nada, nem ninguém, era uma sensação maravilhosa e inédita para mim. Chego a conclusão de que viver a quinta década da minha vida é como voltar a enxergar com nitidez depois de passar 4 décadas míope.